A possibilidade de apropriação de créditos de PIS e COFINS sobre os gastos com Vale-Refeição

O presente artigo tem por objetivo avaliar a possibilidade de apropriação de créditos de PIS e COFINS sobre os gastos com vale-refeição, em função das recentes manifestações da Receita Federal do Brasil (RFB), contrárias a esse creditamento, com o entendimento de que tais gastos não correspondem a um insumo para as atividades das empresas.

Ao analisar o tema, a RFB proferiu o entendimento (Solução de Consulta COSIT 45/2020) favorável ao crédito sobre os gastos com vale-transporte, pois, além ser um benefício fornecido aos funcionários que trabalham diretamente na produção de bens ou prestação de serviços, é também uma despesa decorrente de imposição legal.

A despeito de ser favorável aos contribuintes no ponto em que trata o vale-transporte, foi proferido o entendimento quanto à impossibilidade de caracterização de insumos aos demais itens abordados na Consulta, quais sejam: (i) vale-refeição; (ii) vale-alimentação e (iii) uniformes.

Desta feita, torna-se relevante e necessária a reflexão sobre tal impedimento ao crédito. Tal controvérsia toma força quando apresentada a seguinte questão:  considerando que a Receita Federal autoriza o crédito sobre vale-transporte, que decorre de uma imposição legal, seria correto o crédito sobre o vale-refeição, também decorrente de uma imposição das convenções coletivas?

Para enfrentar tal questão, vale recordar que, após anos de disputas relacionadas ao conceito de insumos, em decisão de fevereiro de 2018, por cinco votos a três, o STJ (REsp 1.221.170) definiu que insumos são todos os bens e serviços essenciais e relevantes para a atividade da empresa, em qualquer fase da produção. Assim, o STJ afirmou que o conceito de insumos não é o restritivo e entendeu que tudo que for essencial e relevante para a empresa produzir receita será insumo para fins de créditos do PIS e da COFINS. Demonstramos abaixo a ementa deste relevante julgado:

TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS. NÃO-CUMULATIVIDADE. CREDITAMENTO. CONCEITO DE INSUMOS. DEFINIÇÃO ADMINISTRATIVA PELAS INSTRUÇÕES NORMATIVAS 247/2002 E 404/2004, DA SRF, QUE TRADUZ PROPÓSITO RESTRITIVO E DESVIRTUADOR DO SEU ALCANCE LEGAL. DESCABIMENTO. DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE INSUMOS À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. RECURSO ESPECIAL DA CONTRIBUINTE PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO, SOB O RITO DO ART. 543-C DO CPC/1973 (ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015).

  1. Para efeito do creditamento relativo às contribuições denominadas PIS e COFINS, a definição restritiva da compreensão de insumo, proposta na IN 247/2002 e na IN 404/2004, ambas da SRF, efetivamente desrespeita o comando contido no art. 3o., II, da Lei 10.637/2002 e da Lei 10.833/2003, que contém rol exemplificativo.
  2. O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte.
  3. Recurso Especial representativo da controvérsia parcialmente conhecido e, nesta extensão, parcialmente provido, para determinar o retorno dos autos à instância de origem, a fim de que se aprecie, em cotejo com o objeto social da empresa, a possibilidade de dedução dos créditos realtivos a custo e despesas com: água, combustíveis e lubrificantes, materiais e exames laboratoriais, materiais de limpeza e equipamentos de proteção individual-EPI.
  4. Sob o rito do art. 543-C do CPC/1973 (arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015), assentam-se as seguintes teses: (a) é ilegal a disciplina de creditamento prevista nas Instruções Normativas da SRF ns. 247/2002 e 404/2004, porquanto compromete a eficácia do sistema de não-cumulatividade da contribuição ao PIS e da COFINS, tal como definido nas Leis 10.637/2002 e 10.833/2003; e (b) o conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios de essencialidade ou relevância, ou seja, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de terminado item – bem ou serviço – para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo Contribuinte.

Depreende-se desse julgado, que os ministros entenderam como passíveis de creditamento de PIS e COFINS, entre outros, os insumos indispensáveis à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, mas que integrem o processo de produção por imposição legal. Vejamos:

“(…) tem-se que o critério da essencialidade diz com o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o produto ou o serviço, constituindo elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço, ou, quando menos, a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência.

Por sua vez, a relevância, considerada como critério definidor de insumo, é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção,

seja pelas singularidades de cada cadeia produtiva (v.g., o papel da água na fabricação de fogos de artifício difere daquele desempenhado na agroindústria), seja por imposição legal (v.g., equipamento de proteção individual – EPI), distanciando-se, nessa medida, da acepção de pertinência, caracterizada, nos termos propostos, pelo emprego da aquisição na produção ou na execução do serviço.

Após o aludido julgado, foi editado o Parecer Normativo COSIT/RFB 5, de 17 de dezembro de 2018, com efeito vinculante no âmbito da RFB em relação à interpretação aplicável à matéria e que apresenta as principais repercussões na definição do conceito de insumos. Vejamos o trecho que nos interessa para o caso em comento:

  1. Prosseguindo, verifica-se que a tese acordada pela maioria dos Ministros foi aquela apresentada inicialmente pela Ministra Regina Helena Costa, segundo a qual o conceito de insumos na legislação das contribuições deve ser identificado “segundo os critérios da essencialidade ou relevância”, explanados da seguinte maneira por ela própria (conforme transcrito acima): a) o “critério da essencialidade diz com o item do qual dependa, intrínseca e fundamentalmente, o produto ou o serviço”: a.1) “constituindo elemento estrutural e inseparável do processo produtivo ou da execução do serviço”; a.2) “ou, quando menos, a sua falta lhes prive de qualidade, quantidade e/ou suficiência”; b) já o critério da relevância “é identificável no item cuja finalidade, embora não indispensável à elaboração do próprio produto ou à prestação do serviço, integre o processo de produção, seja”: b.1) “pelas singularidades de cada cadeia produtiva”; b.2) “por imposição legal”.

Na esteira do julgado do STJ e do Parecer Normativo, a Instrução Normativa 1.911/2019 trouxe novo comando, reconhecendo como insumos os bens e serviços que, mesmo não sendo essenciais ao processo de produção, integram este em razão de imposição legal, como disposto em seu artigo 172, § 1º, reproduzido abaixo:

“§ 1º Consideram-se insumos, inclusive:

I – bens ou serviços que, mesmo utilizados após a finalização do processo de produção, de fabricação ou de prestação de serviços, tenham sua utilização decorrente de imposição legal;

Conforme analisado, não há dúvidas de que os gastos que decorrem de imposição legal são passíveis de creditamento do PIS e da COFINS.

Neste turno, encontramos as despesas relevantes e essenciais que decorrem das obrigações legais firmadas em Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, conforme o artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição Federal e artigo 611 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Para melhor compreensão, passamos a analisar esses dispositivos:

Constituição Federal:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XXVI – reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;

Consolidação das Leis Trabalhistas (Decreto-Lei 5.452/43):

Art. 611 – Convenção Coletiva de Trabalho é o acordo de caráter normativo, pelo qual dois ou mais Sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho.

Em face de todo o exposto e a despeito do posicionamento contrário da RFB com relação ao gasto com vale-refeição, é possível concluir sobre a importância de uma análise individual de cada caso, uma vez que, se a despesa com vale-alimentação for uma imposição da Convenção Coletiva de Trabalho, entendemos que há excelentes argumentos de se pleitear o direito ao crédito.

Com igual fundamento, entendemos ainda que o tema em comento abre a possibilidade de análise de créditos sobre outros gastos que decorrem de Convenção Coletiva de Trabalho, como por exemplo: i) vale-alimentação, ii) planos de saúde; e iii) uniformes.

A PP&C possui um time de especialistas em matéria tributária e pode auxiliar na avaliação da melhor estratégia para monetizar esses créditos.

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Escrito por Marcus Vinicius Montanari, Sócio de Tax da PP&C Auditores Independentes (mv.montanari@ppc.com.br).

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